Desnutrição energético-proteica (DEP)

A desnutrição energético-proteica (DEP) pode ser conceituada como uma doença multifatorial de alta letalidade, que promove diversas alterações fisiológicas na tentativa de adaptar o organismo à escassez de nutrientes. (Sarni e Munekata, 2002)

É o estado de carência calórico-proteica no qual o organismo demonstra desaceleração, interrupção ou declínio de sua evolução normal, com prejuízo bioquímico, funcional e anatômico e aparecimento de complicações que podem levar à morte.

A desnutrição ou, mais corretamente, a deficiência nutricional, pode ser o resultado de pouca alimentação (aporte alimentar insuficiente em energia e nutrientes) ou inadequado aproveitamento dos alimentos ingeridos.

Ambas as condições são causadas por um desequilíbrio entre a necessidade do organismo e a ingestão de nutrientes essenciais. 

Etiologia

Primária

  • Pobreza – subemprego, educação precária, exclusão do sistema de saúde, más condições ambientais
  • Infecções
  • Baixa ingestão
  • Aleitamento artificial e desmame precoce

Secundária

Patologias que acometem os processos relacionados à ingestão, digestão, absorção, metabolização e excreção dos alimentos, como:

  • Estenose Hipertrófica do Piloro
  • Doença Celíaca 
  • Diarreia Crônica
  • Diabetes Mellitus tipo 1
  • Insuficiência Renal
  • Síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS)

Fisiopatologia

A baixa ingestão calórica condiciona adaptações à desnutrição: diminuição da atividade física, estagnação do crescimento (peso e altura), depleção proteica e lipólise.

Quando a restrição energética perdura, o organismo lança mão de vários mecanismos: glicogenólise, gliconeogênese e lipólise. 

A musculatura esquelética, o maior reservatório corpóreo de proteínas, e a gordura corpórea, a principal reserva energética, são consumidas gradativamente às custas da manutenção da homeostase. 

Há dois compartimentos de proteínas no corpo: o somático e o visceral

Somático  representado pelas proteínas dos músculos esqueléticos. Este compartimento é afetado mais severamente no Marasmo.

Visceral – representado pelas reservas proteicas dos órgãos viscerais (armazenadas principalmente o fígado). Este compartimento é afetado mais severamente no Kwashiorkor.

Diagnóstico

  • Exame clínico
  • Exames laboratoriais

Classificação

Quanto à intensidade:

  • Leve 
  • Moderada
  • Grave

Quanto à duração:

  • Aguda 
  • Crônica

Quanto às formas clínicas:

  • Kwashiorkor
  • Marasmo
  • Mista: Kwashiorkor – Marasmático

Marasmo (Lactentes jovens – menores que um ano)

Estado em que a dieta é globalmente deficiente (calorias e proteínas). Ocorre principalmente em lactentes, mas pode ocorrer em adultos por falta de alimentos e por anorexia relacionada às doenças como alcoolismo, doença do sistema nervoso central ou resposta catabólica. 

Ocorre um aumento na liberação de cortisol (este estimula a lipólise do tecido celular subcutâneo e a proteólise da musculatura esquelética para a gliconeogênese – o que leva a um consumo da gordura subcutânea e a uma atrofia muscular).

O marasmo origina-se de categorias moderadas de desnutrição (subnutrição) que permaneceram sofrendo deficiência global de energia. Geralmente, essas crianças não são hospitalizadas pela desnutrição, mas, por uma doença infecciosa aguda que desencadeia um quadro clínico emergencial.

Manifestações clínicas

  • Emagrecimento acentuado e seco
  • Perda do tecido celular subcutâneo e muscular
  • Extremidades delgadas e abdome proeminente
  • Retardo no crescimento – pequena para a idade
  • Cabelos escassos, finos e secos
  • Pele seca, enrugada, com pouca elasticidade
  • Batimentos cardíacos fracos
  • Hipotensão e hipotermia
  • Diarreia
  • Infecções constantes
  • Apetite variável
  • Ausência de lesões de pele
  • Ausência de esteatose hepática
  • Albumina geralmente normal

Kwashiorkor (Crianças maiores que dois anos de idade)

Estado em que a dieta tem carência mais proteica do que energética. Origina-se de quadros leves a moderados de desnutrição por deficiência de proteína com adequada ingestão de energia.

Quando há deficiência proteica, em caso de interrupção no crescimento, as necessidades energéticas são mínimas. Portanto, essas crianças sofrerão um processo de consumo muscular intenso, para suprir as necessidades orgânicas de proteínas, enquanto que o tecido gorduroso subcutâneo está praticamente conservado. O subcutâneo é o último a ser consumido.

Manifestações clínicas

  • Emagrecimento molhado – edema (anasarca)
  • Tecido celular subcutâneo preservado
  • Apatia mental, irritabilidade e baixa resposta à estímulos
  • Alterações na pele (seca, fria, áspera, sem brilho, eritema, descamação, fissuras)
  • Grande emagrecimento do tórax e de segmentos proximais e edema dos segmentos distais (pernas, braços e faces)
  • Palidez e extremidades cianóticas
  • Ausência de apetite
  • Cabelos finos, sem brilho, secos e quebradiços
  • Retardo no crescimento
  • Unhas finas, quebradiças, sem brilho
  • Alterações na mucosa: “língua careca”, retração das gengivas, lábios rachados
  • Hepatomegalia (esteatose hepática) 
  • Ascite
  • Hipoalbuminemia
  • Diarreia com consequente dermatite perianal 

Kwashiorkor – Marasmático (Crianças entre 1 e 2 anos)

É uma representação mista da DEP em que os sinais e sintomas do marasmo e do kwashiorkor frequentemente se combinam (deficiência calórica crônica com deficiência proteica crônica) 

Pode ocorrer, por exemplo, quando um paciente marasmático é submetido a um estresse agudo, como uma infecção ou trauma cirúrgico, de forma que o kwashiorkor se adiciona à desnutrição calórica prévia. (Souza e Miranda Neto, 2007)

Manifestações clínicas

  • Retardo da estatura
  • Retardo do desenvolvimento neuropsicomotor
  • Baixa resistência imunológica
  • Perda de tecido celular subcutâneo
  • Edema de extremidades

Atuação do enfermeiro

A atuação do enfermeiro se baseia no acompanhamento do crescimento e desenvolvimento infantil, por meio de mensurações dos índices antropométricos (peso, altura, estatura, perímetros cefálico, torácico e abdominal e pregas cutâneas), investigando alterações oriundas de doenças que provocam alterações estruturais do organismo.

A partir dos dados obtidos na consulta, o enfermeiro pode identificar as necessidades, elaborar os diagnósticos de enfermagem e estabelecer condutas preventivas ou terapêuticas na assistência à criança, orientando a mãe sobre os cuidados com a alimentação.

É recomendada a padronização da avaliação para cada faixa etária, igualando os critérios utilizados por todos os membros da equipe multidisciplinar.

Referências

Kumar V, Abbas AK, Fausto N. Robbins & Cotran: Patologia – Bases Patológicas das Doenças. 8ª ed. Elsevier, 2010. 

Monteiro FPM, Caetano JA, Araújo TL. Enfermagem na saúde da criança: estudo bibliográfico acerca da avaliação nutricional. Rev. Esc. Anna Nery, vol.14, no.2, Rio de Janeiro, 2010.

Sarni RO, Munekata RV. Terapia nutricional na desnutriçao energético-proteica grave. In: Lopez FA, Sigulem DM, Taddei JA, eds. Fundamentos da terapia nutricional em pediatria. São Paulo: Sarvier; 2002. p. 115-32.

Souza FC, Miranda Neto MH. Desnutrição: inter-relações entre os aspectos celulares e sociais. Maringá – PR, 2007.

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