A monitorização da pressão intracraniana exige esforços tanto do enfermeiro quanto do médico.
O enfermeiro deve avaliar a hipertensão intracraniana e seu significado, reconhecê-la e garantir que as intervenções necessárias sejam iniciadas.
Entendendo a pressão intracraniana
A pressão intracraniana (PIC) é exercida pelo volume combinado de três componentes intracranianos:
- Componente parenquimatoso – estruturas encefálicas – 80%
- Componente liquórico – líquido cefalorraquidiano (LCR) – 10%
- Componente vascular – sangue circulante– 10%
Medida normal da PIC é de 0 a 15 mmHg
A pressão de perfusão cerebral (PPC) é uma estimativa da adequação da circulação cerebral para fornecer oxigênio ao tecido encefálico.
Medida normal da PPC é de 60 a 130 mmHg
A hipertensão intracraniana (HIC) é um estado clínico que acomete muitos pacientes em unidades de tratamento intensivo. É caracterizada pela elevação da pressão intracraniana (PIC) acima de 20 mmHg por no mínimo vinte minutos em adultos e cinco minutos em crianças.
A HIC surge quando há alteração no volume de qualquer componente (tecido, LCR ou sangue).
Aumento do liquor – as alterações liquóricas, geralmente, são aquelas que causam obstrução da circulação liquórica em qualquer ponto de sua via e as que causam dificuldade na reabsorção do LCR.
Aumento do volume cerebral – ocorre pelo crescimento anormal de um tecido (tumores), pelo aparecimento de uma resposta inflamatória em resposta a um agente infeccioso (abscesso ou granulomas) ou pelo acúmulo de líquido nos espaços intersticial e/ou intracelular (edema cerebral)
Aumento do volume sanguíneo cerebral – ocorre por obstrução do retorno venoso, hipóxia, hipercapnia, hipertensão arterial. As lesões vasculares encefálicas e meníngeas (aneurisma, hematoma intracerebral, hemorragia subaracnóide, hematomas subdurais e hematomas extradurais) decorrentes ou não do trauma, também elevam a PIC, uma vez que aumentam o volume intracraniano total.
O aumento da PIC é uma complicação grave que pode resultar em uma herniação com paradas respiratória e cardíaca e morte.
Mecanismos de compensação
Fluxo sanguíneo cerebral (FSC) – o cérebro possui a capacidade de autorregular o FSC, assegurando um fluxo sanguíneo constante por meio dos vasos cerebrais ao longo de uma gama de pressões de perfusão, modificando o diâmetro dos vasos em reposta a alterações na pressão arterial (PA). Nos pacientes com a autorregulação afetada, qualquer alteração da PA pode provocar aumento do FSC e consequentemente da PIC.
Circulação do LCR – O LCR é predominantemente absorvido pelas vilosidades aracnoides localizadas no espaço subaracnoide e dispersado para o sistema venoso por meio do seio sagital superior. Os distúrbios na produção, circulação e absorção do LCR podem contribuir para a elevação da PIC.
Parênquima – o cérebro pode acomodar ou compensar alterações mínimas no volume.
Estágios de ajuste cerebral à HIC (Knobel et al):
- Compensação – o encéfalo é capaz de alterar parte de seu volume, permitindo a expansão dos demais componentes. Nesta fase, a PIC é menor do que a pressão arterial média, permitindo que a perfusão cerebral se mantenha adequada e o paciente não apresente alterações neurológicas
- Descompensação – a partir de um certo volume, a capacidade do encéfalo de compensar o aumento da PIC torna-se ineficaz, aparecendo alterações do nível de consciência, bradicardia, bradipneia e hipertensão arterial e fazendo com que a PIC aumente e a pressão de perfusão cerebral diminua, favorecendo o surgimento de hérnias cerebrais
Existem quatro mecanismos de compensação:
- Desvio de LCR para o espaço subaracnóide;
- Aumento da absorção de LCR;
- Diminuição da produção de LCR e
- Desvio de sangue venoso para fora do crânio.
A HIC requer medidas terapêuticas específicas, dada a vulnerabilidade do sistema nervoso central (SNC).
A monitorização da pressão intracraniana fornece informações que facilitam intervenções precoces para evitar a isquemia cerebral e distorção do tronco encefálico.
Indicações para medida da PIC
- Aumento do volume do encéfalo: edema cerebral, traumatismo, cirurgia, acidente vascular cerebral, tumor
- Aumento do volume de sangue: hematoma, malformação arteriovenosa (MAV), aneurisma, acidente vascular cerebral
- Aumento do volume de LCR: diminuição da reabsorção de LCR, hidrocefalia congênita
- Lesões: tumores e abscessos
- Glasgow inferior a 9 com tomografia computadorizada (TC) de crânio anormal
- Glasgow inferior a 9, com TC de crânio normal, porém com dois ou mais fatores associados como: idade superior a 40 anos, pressão arterial sistólica inferior a 90mmHg e postura anormal (decorticação ou descerebração) uni ou bilateralmente
Vantagens da monitorização
- Detectar precocemente a elevação da PIC, sendo possível suspeitar de risco de herniação ou lesões expansivas intracranianas
- Permitir a drenagem de LCR, reduzindo a PIC e melhorando a perfusão cerebral
- Permitir a adoção de tratamento adequado
- Avaliar os resultados (evolução) do tratamento
- Auxiliar na determinação do prognóstico
Monitorização
A monitorização da PIC é feita por meio da análise da pressão liquórica, a partir de parafusos cranianos e cateteres de silicone ou polietileno e, também de fibra ótica, conectados à monitores.
Posições do cateter
- Ventricular – maior precisão
- Parenquimatosa – boa precisão
- Subdural/Subaracnóide/Epidural – menor precisão
A atuação do enfermeiro deve estar voltada para a manutenção da circulação encefálica efetiva mediante a preservação da pressão de perfusão cerebral e oferta de oxigênio e glicose.
Alguns cuidados
Ventilação:
- Avaliar padrões respiratórios e frequência respiratória
- Promover oferta de oxigênio a 100% antes das aspirações traqueobrônquicas – impede o aumento do CO2 – vasodilatador que aumenta a PIC
- Monitorar continuamente a oximetria de pulso e gasometria arterial
Avaliação neurológica:
- Avaliar o estado neurológico: estado mental, pupilas, função motora – alterações indicam deterioração neurológica e necessidade de intervenção precoce
- Avaliar os sinais vitais – a pressão arterial media correlaciona-se com a PIC no paciente com perda da autorregulação
Posicionamento:
- Manter alinhamento cefalo-caudal – usar coxins ou travesseiros
- Manter a cabeceira elevada a 30 graus do plano horizontal – se não houver contraindicação (ex. trauma raquimedular)
- Evitar flexão do quadril – diminui a pressão intratorácica
- Evitar agrupamento de cuidados – mudança de decúbito, banho, aspiração – reduzir picos prolongados na PIC
- Avaliar a agitação em pacientes com contenção mecânica – aumento da PIC
- Estar atento as medidas de prevenção de convulsões
Controle de temperatura:
- Verificar com frequência a temperatura – a taxa metabólica cerebral aumenta com a temperatura elevada
- Manter temperatura corporal menor que 37, 5C – se necessário usar colchão térmico
- Resfriar o paciente gradualmente – os calafrios aumentam a PIC
Controle da glicemia:
- Monitorar a glicose sérica e glicemia capilar a cada 4 ou 6 horas – alterações na glicose podem provocar alterações na taxa metabólica
Manutenção do cateter:
- Atenção para não deslocar/tracionar o cateter
- Realizar curativo diariamente no local da inserção do cateter utilizando antisséptico padronizado
Doutora em Ciências (EEUSP), pós-graduada em Administração Hospitalar (UNAERP) e Saúde do Adulto Institucionalizado (EEUSP), especialista em Terapia Intensiva (SOBETI) e em Gerenciamento em Enfermagem (SOBRAGEN). É professora titular da Universidade Paulista no Curso de Enfermagem, e professora do Programa de Especialização Lato-sensu em Enfermagem em Terapia Intensiva e Enfermagem do Trabalho na Universidade Paulista.